Por que desses paises provem muitos refugiados

Por que desses paises provem muitos refugiados
Organização recolhe migrantes que tentam chegar à Europa em barcos  (Foto: Chris McGrath/Getty Images)

Em 2016, o número de deslocados forçados no planeta bateu um novo recorde, chegando à marca de 65,6 milhões de pessoas, segundo relatório anual do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (Acnur).

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    A cifra inclui indivíduos que fogem de perseguições, conflitos, violência e violações dos direitos humanos e representa um acréscimo de 300 mil em relação a 2015. São ao todo 40,3 milhões de deslocados internos (dentro das fronteiras de seu próprio país), 22,5 milhões de refugiados e 2,8 milhões de solicitantes de refúgio.

    Esse número sem precedentes se deve sobretudo à Síria, que responde por quase 20% do total de deslocados forçados em 2016, mas também a outras guerras que acabam em segundo plano por causa da gravidade da situação no país árabe. Veja os conflitos que mais contribuem para a pior crise de refugiados desde a Segunda Guerra Mundial:

    Síria (12 milhões de deslocados)
    Iniciada em março de 2011, a guerra civil na Síria já deixou mais de 400 mil mortos e parece longe de acanar. Os confrontos começaram após o regime de Bashar al Assad, no poder desde 2000, ter reprimido manifestações pró-democracia. A situação se deteriorou rapidamente, e o país logo se tornou teatro das disputas de poder que dominam o Oriente Médio e a Península Árabe.

    De um lado, uma miríade de grupos rebeldes, alguns armados e treinados pelos Estados Unidos (ao menos até o mês passado, quando Donald Trump encerrou o programa secreto de colaboração levado a cabo pela CIA) e pelas monarquias sunitas da região, principalmente a Arábia Saudita, lutam pela deposição de Assad. Do outro, a Rússia e os xiitas Irã e Hezbollah defendem a manutenção do presidente.

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    E todos eles lutam contra os grupos terroristas Fatah al Sham (antiga Frente al Nusra, ligada à Al Qaeda) e Estado Islâmico (EI), que se aproveitaram do caos para conquistar amplos territórios. A guerra já gerou 6,3 milhões de deslocados internos, 5,5 milhões de refugiados e 185 mil solicitantes de refúgio, segundo dados do fim de 2016.

    Colômbia (7,7 milhões)
    O segundo país nessa lista é vizinho do Brasil: mais de meio século de conflitos contra guerrilhas levaram a Colômbia a uma das maiores emergências humanitárias do mundo, com 7,7 milhões de deslocados forçados, sendo 7,4 milhões dentro de suas fronteiras e pouco mais de 300 mil refugiados - 679 deles vivem em solo brasileiro.

    No fim do ano passado, o governo assinou um acordo de paz com as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc), o maior grupo guerrilheiro do país e que recentemente concluiu seu desarmamento, iniciando a transição para a vida civil. Porém isso não será suficiente para resolver o problema.

    Apesar do peso simbólico da extinção das Farc, a Colômbia ainda luta contra outras organizações paramilitares e narcotraficantes, além de ter a oitava maior taxa de homicídios intencionais do planeta (27,9 para cada 100 mil habitantes), segundo o Banco Mundial.

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    Prova disso é que no ano passado, quando foi concluído o acordo com as Farc, sua população de deslocados internos - que é a maior do mundo - teve um acréscimo de 500 mil pessoas.

    Afeganistão (4,7 milhões)
    Outro conflito que se arrasta há anos é o do Afeganistão. A invasão norte-americana de 2001 conseguiu depor o regime do Talibã, mas o grupo fundamentalista segue ativo e hoje ainda divide espaço com o EI, que ganhou força no país. Recentemente, Washington despejou a "mãe de todas as bombas", arma mais potente de seu arsenal não-nuclear, para atingir jihadistas nas montanhas afegãs.

    Os EUA ainda mantêm cerca de 10 mil soldados na nação asiática e estudam reforçar o contingente para conter a insurgência do Talibã. Por outro lado, o Exército local não consegue controlar todo o território nacional, o que abre espaço para recorrentes atentados, inclusive na capital Cabul.

    O arrastado conflito gerou uma população de 1,8 milhão de deslocados internos e espalhou 2,5 milhões de refugiados e 400 mil solicitantes de refúgio por outras nações.

    Iraque (4,2 milhões)
    Tal qual a Síria, o Iraque enfrenta atualmente uma árdua batalha para derrotar o Estado Islâmico, que se aproveitou da instabilidade no país após a retirada norte-americana, em 2011, e de suas divisões religiosas para conquistar territórios.

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    O EI ascendeu durante o governo do xiita Nuri al Maliki (2006-2014), acusado de incentivar a polarização com a minoria sunita, a mesma vertente do Islã, em uma versão mais radical, que serve de base para o grupo jihadista. No fim de 2016, 4,2 milhões de deslocados forçados eram do Iraque, 86% deles internamente (3,6 milhões). O restante era de refugiados (316 mil) e de solicitantes de refúgio (278 mil).

    O Exército iraquiano, apoiado pela coalizão liderada pelos EUA, tem conquistado importantes vitórias contra o Estado Islâmico, como a retomada de Mosul, no início de julho, mas os combates são catalisadores de crises humanitárias e desestimulam as pessoas a voltarem a suas casas enquanto não houver uma garantia de mínima estabilidade.

    Sudão do Sul (3,3 milhões)
    Independente desde julho de 2011, após uma guerra que ceifou a vida de mais de 2,5 milhões de pessoas, o Sudão do Sul é a nação mais jovem do planeta, mas também é palco de um dos conflitos mais violentos da atualidade.

    Os confrontos eclodiram no fim de 2013, quando o então vice-presidente Riek Machar iniciou uma rebelião contra o mandatário Salva Kiir, que governa o país desde sua fundação. Da capital Juba, os combates se disseminaram pelo país, apesar de diversas tréguas acordadas desde então.

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    Em julho de 2016, o Sudão do Sul presenciou uma nova escalada da violência interétnica, com os conflitos entre as forças de Kiir e Machar chegando até a regiões mais pacíficas, como algumas áreas de Equatoria, no extremo meridional da nação africana.

    Segundo o Acnur, um em cada quatro sul-sudaneses foi forçado a abandonar sua casa, o que significa um número de 3,3 milhões de pessoas. 1,4 milhão delas fugiram como refugiadas para países vizinhos, principalmente Uganda (639 mil), Etiópia (338,8 mil) e Sudão (297,2 mil), a nação da qual o Sudão do Sul se separou. Outros 1,9 milhão de indivíduos se deslocaram internamente.

    O Brasil contabilizava, em dezembro de 2018, 11.231 refugiados já reconhecidos. Desse total, 72% são homens e 28% mulheres. Naquele mesmo mês, havia 161.057 solicitações de reconhecimento da condição de refugiado. Dos refugiados já reconhecidos, 36% são sírios; 15% congoleses; 9% angolanos; 7% colombianos e 3% venezuelanos.

    Os dados constam da 4ª edição da publicação Refúgio em Números, divulgada hoje (25) pelo Comitê Nacional para os Refugiados (Conare) e pelo Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (Acnur). De acordo com o levantamento há, no mundo, 25,9 milhões de refugiados. Ao final de 2018, cerca de 70,8 milhões de pessoas foram forçadas a deixar seus locais de origem, motivadas por diferentes tipos de conflitos.

    Refugiados

    O documento traz os dados atualizados sobre solicitações de refúgio e reconhecimento da condição de refugiado no país, bem como números recentes sobre a conjuntura de refugiados no Brasil e no mundo. Segundo a Acnur, 67% dos refugiados no mundo vieram de três países: Síria (6,7 milhões), Afeganistão (2,7 milhões) e Sudão do Sul (2,3 milhões).

    Já os países que mais receberam refugiados foram Turquia (3,7 milhões), Paquistão (1,4 milhão) e Uganda (1,2 milhão). São consideradas refugiadas, pessoas que estão fora de seu país de origem devido a “fundados temores de perseguição relacionados a questões de raça, religião, nacionalidade, pertencimento a um grupo social específico ou opinião política e não podem ou não querem valer-se da proteção de seu país”, bem como devido à “grave e generalizada violação de direitos humanos”.

    Brasil

    Em 2011, o Brasil já havia reconhecido 4.035 refugiados, número que chegou a 7.262 em 2014, e a 11.231 em 2018. Segundo o coordenador-geral do Conare, Bernardo Laferté, três ondas migratórias recentes chamam mais atenção no Brasil: a do Haiti, iniciada em 2010; a de Sírios e, mais recentemente, a dos venezuelanos.

    “No caso dos haitianos, essa onda migratória se estendeu fortemente até 2016 e, agora, mais recentemente, voltou a ter um número considerável. No caso dos Sírios, a onda ocorreu por eles estarem vivendo um dos maiores conflitos do mundo atual, pelos laços históricos que sua população tem com o Brasil, e pelas facilidades para obtenção de visto, autorização de residência e refúgio", disse o coordenador.

    Já com relação à Venezuela, a onda de migração ocorreu, segundo o coordenador do Conare, "por tudo o que eles têm passado e pela vocação brasileira em acolhê-los, o que já resultou em mais de 10 mil de venezuelanos interiorizados com base no programa do governo federal”.

    Apesar de os venezuelanos representarem apenas 3% dos reconhecimentos de refugiados, são eles os que apresentaram maior número de solicitações para a obtenção de refúgio no Brasil. “Em 2018, dos 80 mil pedidos de entrada [no país], 61 mil foram feitos por venezuelanos. No ano anterior, foram feitos 35 mil pedidos, dos quais 17 mil eram de venezuelanos”, informou Laferté.

    Critérios

    Ele explica que adaptações feitas nos critérios para a obtenção de refúgio tornarão mais fácil a obtenção de refúgio pelos venezuelanos no Brasil. “Isso ficará bastante evidente quando os números referentes a 2019 forem consolidados, já considerando as alterações dos critérios”, acrescentou.

    Dos 777 refugiados reconhecidos em 2018, apenas cinco eram venezuelanos. Em 2019, o Conare já reconheceu cerca de 230 deles como refugiados. “Há entendimento de que a Venezuela passa por uma situação de grave e generalizada violação de direitos humanos, o que funciona como critério objetivo da determinação de condição de refugiado desses nacionais. Dessa forma, o processo ficará mais simplificado, e será mais facilitada a determinação da condição de refugiado”, completou o coordenador-geral do Conare.

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    Os critérios complementares adotados pelo Conare possibilitarão o reconhecimento de refugiados venezuelanos que não tinham, contra si, "fundado temor de perseguição individualizado", algo que dificultava encontrar fundamento para reconhecer aqueles que fogem de seu país, motivados por desemprego, fome ou questões estruturais.

    Das solicitações de refúgio em trâmite no Brasil, 52% são de venezuelanos; 10% de haitianos, 5% de senegaleses, 4% de cubanos, e 3% de sírios. Segundo Laferté, o Conare ainda não analisou casos concretos de médicos cubanos oriundos do programa Mais Médicos, que tenham pedido refúgio no Brasil.

    “Nós até identificamos movimento de médicos cubanos após o final do contrato com Cuba, mas ainda não analisamos nenhum caso concreto de médicos cubanos oriundos do programa Mais Médicos”, informou o coordenador.