Por que sou tao feia

Eu queria contar uma história. Ela é para quem quiser ler, mas especialmente para todas a meninas e mulheres que conseguiram chegar até aqui. 

Hoje eu acordei me sentindo feia. Nos últimos dias eu tenho me sentido assim, e não só no sentido da aparência. Eu me sinto feia por completo, estou cansada de viver dentro de mim, e caramba...esse é um sentimento difícil de sentir. Sentir que você não é importante, que sempre vai ter alguém melhor que você, e que você não vale a pena o suficiente nem para você mesma. Foda.
Mas eu decidi pensar sobre esse sentimento e como eu cheguei até aqui. Sentada, chorando, olhando pro espelho e pensando o quanto minha vida seria mais fácil se eu fosse bonita.

A primeira vez que eu entendi que era feia foi na escola, lá pelos meus 6 anos. Antes disso eu me achava normal, minha família vivia me dizendo que eu era linda, a maioria das mulheres a minha volta eram gordas e eu as achava lindas e realmente não via problema nenhum nisso. Mas a escola chega e com ela o gostinho do que vai ser o resto da sua vida em sociedade chega junto. Eu era muito insegura e isso me tornava um alvo fácil. E foi basicamente isso que eu fui durante muito tempo: um alvo fácil.

Os apelidos eram diversos, as brincadeiras eram perversas e já cheguei a ser jogada no chão com força, logo após de ser chamada de gorda e feia. Gorda... feia...gorda...feia e gorda. Então esse era o problema. A gordura, o tamanho, a aparência! Por parte de alguns familiares a cobrança vinha também, ao tentarem usar o famoso argumento de que eu seria a tia solteirona e que eu deveria fazer dieta, e todos esses clichês que quem é gordo desde criança já ouviu. Isso entrou na minha cabeça e não saiu mais, o medo da solidão, da rejeição e de não ser bonita o suficiente pra ninguém, nem pra mim mesma. 

E durante todos os anos seguintes eu fui nutrindo um ódio crescente não só pelo me corpo, mas por mim mesma no geral. Passei a nunca mostrar meus braços gordos em público, a dormir de cinta, a vomitar, a fazer dietas loucas, a sonhar com plásticas, a não olhar pro espelho e nunca aparecer em fotos. Passei tanto tempo sentindo dor por ser gorda que eu mesma comecei a me auto sabotar. Comecei a me maltratar antes que alguém fizesse isso comigo. Eu repetia pra mim mesma “você é feia, você é gorda, você é inútil.” Porque se alguém viesse falar isso pra mim, não seria mais ofensa. Seria a verdade. E dessa forma, perante a qualquer mínima chance de rejeição ou ridicularização eu já estava armada, sempre com medo da humilhação...sempre odiando cada centímetro meu. E esse ódio foi crescendo além do corpo e passando pra personalidade, até que chegou um dia que eu não aguentava mais viver em mim mesma.

E eu achava que se emagrecesse todos os meus problemas iam sumir. Eu ficava olhando aquelas fotos de mulheres lindas e desejava cada dia mais ser baixa, magra, ter pouco peito e muita bunda. Desejava ser mais inteligente, ter uma voz mais bonita, ter menos bochecha, ter olhos claros, todo esse pacote. Achava que se eu me parecesse mais com elas talvez minha vida fosse mais fácil, as coisas dariam certo, eu ia conseguir usar uma camiseta e legging sem parecer um balão, e eu iria ser finalmente feliz. Então eu estava determinada a ser tudo aquilo que eu sempre sonhei. E aconteceu.

Eu emagreci quase 40 quilos, mas adivinhem só: não adiantou nada. Eu ainda não gostava de mim. A reação do mundo não foi diferente, uma das primeiras coisas que eu ouvi depois de emagrecer foi “agora vai fazer cirurgia para levantar esses peitos aí né?”. Foi aí que eu percebi que não adiantaria nada, eu poderia emagrecer, arrumar o peito, alisar o cabelo, fazer de tudo...que ainda não estaria bom.  E o mais importante de tudo: a única pessoa que poderia resolver todo esse ódio dentro de mim, era eu mesma. Foda. Logo eu? Mas eu sou a pessoa que mais me odeia! A que mais me maltrata, me xinga e me deixa triste. Eu? 

E aí entra a parada do tal do amor próprio né? Que parece uma coisa linda e fácil que vai dar certo e que em 30 dias você vai sair se sentindo a mulher mais bonita do mundo. Eu, achando que era assim, comecei a trabalhar minha autoestima, a mudar alguns hábitos de auto sabotagem e tentei me olhar com olhos mais gentis. Fiz uma limpa no instagram, comecei a seguir mulheres que se pareciam comigo, conheci o canal da Alexandra Gurgel e procurei por músicas que me ajudassem. Eu tive alguns picos de autoestima que foram muito gratificantes, mas nada estável e nem de longa duração, e essa foi a parte mais difícil: entender que eu demorei 18 anos construindo esse ódio dentro de mim. Não é em 30 dias, ou nem um ano, que eu vou começar a me amar completamente e passar a ter uma confiança extrema. Não é assim.

Eu estou melhor. Mas eu ainda penso milhões de vezes antes de postar uma foto, eu me preocupo com o que acham de mim, eu ainda vou de camiseta pra praia, eu ainda acho que ninguém vai se apaixonar por mim, eu ainda tenho vergonha. Mas agora eu uso roupas brancas e coloridas (não só preto pra disfarçar), eu uso regatas as vezes, eu faço questão de falar pra cada mulher que eu conheço que elas são lindas, eu me olho no espelho todos os dias e eu consigo experimentar roupas sem chorar. Eu ainda estou no processo e vou ficar nele até o último dia da minha vida, porque o amor próprio não é o destino. É a caminhada.

O que eu quero dizer, é que você vai conseguir se amar. Um dia você vai olhar no espelho, aquele mesmo espelho que você evitou olhar durante anos, e vai enxergar uma coisa boa. Você vai pensar “caralho que mulher!” e depois vai colocar uma regata e sair por aí. Você vai conseguir ir à praia sem nenhuma camiseta por cima e vai se divertir, você vai namorar, beijar e encontrar alguém que gosta de verdade de você. Mas esse sentimento não vai ser eterno e você vai ter que lidar com isso. Tem dias que mesmo se amando você vai pensar que aquele cara não te quer porque você é feia, ou você simplesmente não vai conseguir se olhar no espelho sem chorar. Mas isso não significa que você perdeu, isso significa que aquela menina que foi empurrada, xingada, pressionada e que pensava em cortar a barriga com uma tesoura enquanto chorava sozinha no banheiro, ainda existe dentro de você, e sempre vai existir. Porque ela é uma grande parte de você. O que você precisa aprender é simplesmente olhar para essa garotinha e dizer: “Eu sei como você se sente. Mas nada dura para sempre. Você vai ficar bem, você é linda.”. Não deixe a garotinha assumir o controle do medo, ela precisa ser amada por alguém. E esse alguém é você. Seja quem você precisava quando era criança.

Eu sempre ligo para um amigo meu quando estou tendo crises e ele sempre me diz “Pare de procurar fora o que você sabe que você só vai encontrar aí dentro.” E é isso. A resposta está dentro. Mas ela não é concreta, nem linear e nem perfeita. Assim como você não é nada disso. Então pare de procurar aceitação ou amor do lado de fora, eles são importantes e em alguns casos eles te ajudam no processo, claro, mas não mais do que o seu bem-estar com você mesma. Você tem as rédeas da tua vida. Você. E isso é uma pressão danada, eu sei. Mas você consegue. Eu sei que consegue.

Porque eu estou aqui, agora. E nós sobrevivemos até aqui. Fique viva, fique bem e fique linda do seu jeito porque a garotinha precisa de você. Cuide dela.

"Ler na internet sobre pessoas que passavam pela mesma situação me ajudou muito, foi um processo lento mas foi maravilhoso e eu colho os frutos até hoje".

Perguntamos na nossa página no Facebook para nossos leitores contarem seus problemas de autoestima que eles chegaram a pensar que só eles tinham, e que os afetaram demais. Estas são algumas das respostas.

"Minha fase de adolescente foi trevosa! Autoestima baixíssima porque sempre fui gorda e na adolescência o tal "padrão" sufoca demais. Mesmo hoje que as coisas melhoraram sinto como isso ainda pesa na hora de conhecer alguém ou receber um elogio. Fotos são um drama à parte, ainda mais hoje em dia que tudo é muito baseado na exposição. Hoje minha autoestima é uma montanha russa, mas nem se compara com a da adolescência, que era nula".

"Hoje dói muito olhar pra trás e ver que ninguém fez nada por mim, quando poucas palavras teriam sido de grande ajuda. Ler na internet sobre pessoas que passavam pela mesma situação me ajudou muito, foi um processo lento mas foi maravilhoso e eu colho os frutos até hoje".

"Quando eu tinha 14 anos comecei a ter problemas de autoestima porque todas as minhas amigas começaram a se desenvolver e eu não. Ainda por cima uma menina em especial praticava bullying comigo, falando que eu nunca ia chamar a atenção de ninguém e um dia chegou a dizer que eu deveria me matar. Eu não conseguia revidar. O menino de quem eu gostava também não colaborava, me chamava de feia, perna torta, bocão.

Mas com o tempo aprendi a me amar e hoje não tenho mais problema com isso, graças a Deus. Ver meu diário de adolescência é um horror e eu diria pra eu de 14 anos: AMIGA, VOCÊ ARRASA!"

"Passei por muitos problemas durante a infância e adolescência que fizeram com que eu parasse de acreditar em mim e qualquer pessoa a minha volta. Junto dessa tristeza que já me acompanhava, ouvia comentários extremamente maldosos e desnecessários na escola sobre minha imagem e rapidamente passei a acreditar nas besteiras que ouvia.

No ano passado passei a me abrir mais a certos movimentos, principalmente o feminista, que além da igualdade de gênero "prega" muito a questão da auto aceitação, e a cada dia que passava eu notava que os meus detalhes "diferentes" me faziam única. Hoje eu me olho no espelho e me sinto linda!

O mais incrível disso é que você passa a ser mais... leve. Antes, além de me julgar muito, eu julgava muito os outros pra me sentir menos mal comigo mesma e isso é extremamente destrutivo e triste. Hoje percebo beleza em todos e a vida anda bem melhor assim".

"Quando eu era criança sofri muito bulliyng na escola por ser considerada feia. Aprendi a desenvolver minha personalidade com o tempo mas a sensação de se sentir feia é horrível, ainda me sinto na obrigação de emagrecer. Mas precisamos nos unir e aceitar nossa beleza. Dar exemplos bons umas para as outras".

"Eu sofria de ansiedade social tão forte que tinha vergonha de mudar coisas simples, como corte de cabelo e roupas. Achava que isso era algo que só eu sentia. Vivi com isso dos 10 anos aos 17 sem saber que era uma doença. Tive várias crises de ansiedade durante esse período e não fazia ideia do que era".

"Quando mais nova eu me sentia horrível. Me sentia uma pessoa desprezível mesmo. Me olhava todos os dias no espelho e chorava falando pra mim mesma o quanto eu era ridícula, feia e me odiava. Hoje em dia tenho momentos de fraqueza e quando me deixo abater e me coloco para baixo, mas penso "se eu não me amar, quem vai?". Se eu não aceitar quem eu sou, a minha própria essência fica ferida.

Tive uma evolução enorme e comecei a me sentir bem comigo mesma quando comecei a conhecer mais sobre os ideais do feminismo. O movimento me ajudou a amar quem eu sou, independente de como eu sou. Como diz RuPaul: 'Se você não amar a si mesma, como raios vai amar outra pessoa?'"

"Eu já tive sérios problemas de timidez, em um nível que eu não tinha coragem de falar com ninguém que não fosse da minha família, mesmo que a pessoa me dirigisse a palavra. Até na hora de sair com amigos eu tinha medo e vergonha. Hoje estou bem mais seguro com relação às pessoas, mas lamento ver que poderia ter feito mais amigos na vida se não fosse esse problema".

"Eu já tive muitos relacionamentos abusivos. Alguns caras diziam que eu não era bonita o suficiente, boa o suficiente. E eu não me achava capaz de encontrar caras melhores. Com as críticas, cheguei a cobrir os espelhos da minha casa. Hoje vivo uma luta diária para me adaptar ao meu corpo, para me reconhecer como a mulher "bem sucedida" que sou. É matar um leão por dia".

"Eu achava que não era interessante o bastante para andar com algumas pessoas. Que elas faziam um esforço para me aceitar por caridade.

Eu me sentia culpada por não me encaixar, por não concordar com algumas atitudes delas, e me sentia sozinha porque não via como consertar isso. Mas acabei me afastando delas (ou elas de mim), e isso foi muito bom. Muito bom mesmo".

"Desde criança eu sempre me senti inferior aos demais. Me sinto mal quando as pessoas riem perto de mim, porque imagino que eu seja o motivo da chacota. É difícil falar disso com os outros porque já ouvi de ex-namorados que eu apenas gosto de me fazer de vítima – mas olha, se eu tivesse escolha, jamais iria querer me sentir assim, e não quero que mais ninguém se sinta.

Isso me encheu minha vida de frustrações, tanto na faculdade como nos relacionamentos. Hoje, aos 26, faço terapia cognitivo-comportamental pra tentar contornar esses sentimentos".

"Até hoje às vezes me pego rindo quando alguém me elogia e fala que eu sou bonita ou inteligente. Não por estar feliz com o elogio, mas sim por entender como uma brincadeira, ou como um esforço da pessoa em me agradar. Racionalmente sei que não é assim e, ao escrever, essas coisas me parecem ainda mais ridículas".

"Não consigo mandar uma mensagem para alguém sem pensar que essa pessoa me odeia, me acha ridícula, que eu encho o saco. E se a pessoa não me responde então, tenho vontade de comer meus dedos. E foi assim que me transformei numa pessoa isolada socialmente, o que é aprofundado pelo fato de trabalhar em home office – mas isso não é uma reclamação, porque eu gosto de trabalhar assim".

"Quando era adolescente tive muitos problemas de autoestima. Sempre era excluído das rodas de amigos, as garotas não me cumprimentavam com um beijo no rosto como faziam com os outros meninos e eu era motivo de piada por parte da ala masculina sempre. Sentia que não me encaixava porque eu era "feio".

O tempo foi passando, fui crescendo, conheci gente que não me julgava por questões de aparência, que me elogiavam, fui aceitando essa ideia é percebendo que eu não era tão feio assim. Hoje, aceito minha aparência da forma que é, mas principalmente sei que sou uma pessoa que possui uma beleza que vai além da estética. Amor próprio, minha gente, acima de tudo!"

"Às vezes eu me sinto incrível, penso em tudo que eu tenho, que sou e que conquistei, mas logo em seguida penso que não sou merecedora dessas coisas por alguma razão, e eu não sei explicar isso direito. Hoje estou sozinha e penso que é por que estou acima do peso ou porque sou insuportável e nunca ninguém vai me aguentar. Isso tudo ao mesmo tempo que me acho interessante e batalhadora".

"Eu ainda tenho o hábito de me comparar com outras pessoas. No começo era com a beleza das outras meninas, mas depois comecei a me comparar intelectualmente. Houve momentos insuportáveis. Estou buscando tratamento e atividades que me agradam para que eu possa "me encontrar". Recebo muito apoio dos meus familiares, namorado e amigos... Sem eles eu realmente não conseguiria "enxergar" minhas qualidades.

Todo dia a gente precisa buscar uma maneira de resistir, de driblar esses sentimentos que nos consomem a gente. Eu sei que vou ficar bem algum dia, porque sempre travo uma batalha interna contra isso".

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